domingo, 31 de julho de 2011

A Alegria na Tristeza

Acrílico s/tela
Alex Rocha

O título desse texto na verdade não é meu, e sim de um poema do uruguaio Mario Benedetti. No original, chama-se "Alegría de la tristeza" e está no livro "La vida ese paréntesis" que, até onde sei, permanece inédito no Brasil.

O poema diz que a gente pode entristecer-se por vários motivos ou por nenhum motivo aparente, a tristeza pode ser por nós mesmos ou pelas dores do mundo, pode advir de uma palavra ou de um gesto, mas que ela sempre aparece e devemos nos aprontar para recebê-la, porque existe uma alegria inesperada na tristeza, que vem do fato de ainda conseguirmos senti-la.

Pode parecer confuso mas é um alento. Olhe para o lado: estamos vivendo numa era em que pessoas matam em briga de trânsito, matam por um boné, matam para se divertir. Além disso, as pessoas estão sem dinheiro. Quem tem emprego, segura. Quem não tem, procura. Os que possuem um amor desconfiam até da própria sombra, já que há muita oferta de sexo no mercado. E a gente corre pra caramba, é escravo do relógio, não consegue mais ficar deitado numa rede, lendo um livro, ouvindo música. Há tanta coisa pra fazer que resta pouco tempo pra sentir.

Por isso, qualquer sentimento é bem-vindo, mesmo que não seja uma euforia, um gozo, um entusiasmo, mesmo que seja uma melancolia. Sentir é um verbo que se conjuga para dentro, ao contrário do fazer, que é conjugado pra fora.

Sentir alimenta, sentir ensina, sentir aquieta. Fazer é muito barulhento.

Sentir é um retiro, fazer é uma festa. O sentir não pode ser escutado, apenas auscultado. Sentir e fazer, ambos são necessários, mas só o fazer rende grana, contatos, diplomas, convites, aquisições. Até parece que sentir não serve para subir na vida.

Uma pessoa triste é evitada. Não cabe no mundo da propaganda dos cremes dentais, dos pagodes, dos carnavais. Tristeza parece praga, lepra, doença contagiosa, um estacionamento proibido. Ok, tristeza não faz realmente bem pra saúde, mas a introspecção é um recuo providencial, pois é quando silenciamos que melhor conversamos com nossos botões. E dessa conversa sai luz, lições, sinais, e a tristeza acaba saindo também, dando espaço para uma alegria nova e revitalizada. Triste é não sentir nada.

Martha Medeiros

sábado, 30 de julho de 2011

A FLOR

 


A vida na força das cores e pinceladas. O movimento nos traços, a inquietude e brevidade no viver. A sede, a fome, a necessidade, nos faz correr em direção ao alvo. Às vezes inconscientemente corremos. Mesmo a flor que parece nascer exclusivamente para ser bela, se contorce acorrentada ao solo por essa razão, hora por uma gota d'água, hora um cheiro e o carinho na face de suas pétalas por um beija-flor.

Alex Rocha

quinta-feira, 28 de julho de 2011

A INSPIRAÇÃO

Estudo p/Pintura
Acrílico s/papel



Muitos têm descrito a inspiração como uma sensação de que algo está sendo ditado diretamente a seus ouvidos por alguma coisa, e outros até dizem que estavam em um estado de consciência alterado quando a inspiração surgiu , porem, todos têm certeza absoluta de que a a inspiração deve ser usada ou compartilhada. Não está sob o controle de nossa vontade, porém pode aparecer a qualquer momento, como um raio ou piscar dos olhos. Dizem que, trabalhando com disciplina, paciência e preparação, combinados com um desejo ardente, podemos abrir o canal para alcançarmos este estado almejado. A inspiração pode ocorrer durante o desenvolver da atividade intelectual, porém não trabalha através do intelecto. Pode chegar como um quadro completo ou simplesmente como um vago sentimento ou intuição.

CONSTRUÇÃO


Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego


Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico

Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado

Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague








Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague


Chico Buarque

sexta-feira, 22 de julho de 2011

ESTOJO DE PINTURA



ACRÍLICO S/TELA
ESTOJO DE PINTURA
ALEX ROCHA

O Baú tinha uma textura fria, era de uma madeira pesada, escura e antiga. Não sabia como ele fora parar ali, no seu quarto. Como uma peça tão antiquada e estranha a tudo mais que o cercava fora parar ali? Seria a gravidade, a atração dos iguais? Não lembra vê-lo em outro lugar da casa, esse Baú nascera junto com ele e com o quarto, tornando-se natural e inquestionável. Nunca fizera mesmo a pergunta do como e porque ele estava ali. Se ele pudesse recordar, era sobre esse bloco que punha seus pés moles de menino para ver o Quintal. O Baú ficava bem ali, no lado esquerdo da janela. Os músculos de seus braços se enrijeceram empurrando-o mais para a direita, mais a baixo da janela; ele pisava o seu casco sem dó a fim de ver no Quintal o espetáculo das galinhas ciscando e cantando suas glossolalias, a terra rubra e as pedras cheia de grandes segredos, prestes a saltarem para suas mãos pequenas demais para eles. Era ali, no terreiro, o deserto onde gerava a civilização de suas fantasias, e com seus sonhos amolecia e entortava os metais de suas cidadelas, feitas de pecinhas furtadas da Sucata.

O Baú era o degrau que o elevava até o seu Universo. Atravessava a janela e fugia da gaiola de cimento, cujos artefatos não podia tocar sem enfrentar censuras; fugia da gaiola e renascia deus, artesão do lixo e das escórias repudiadas pelo Lar. O Quintal era o Éden de um imperador que não se entristecia com a solidão, era bom que estivesse só!, em seu lugar de inocência e de ausência de juízos, onde sua força girava livre em jogos, e os gestos podiam alçar os maiores vôos; nada poderia ferir os balões de idéias com que esses gestos planavam soltos, e também as idéias pegavam caronas nesses gestos flutuantes. O Baú, perna postiça com qual se agigantava e se esbanjava no terreiro. E os cacarejos das galinhas subiam como adorações e salmos ao senhor das pedras, o deus da terra e dos metais. Depois, o deus voltava ao seu pudor de menino, e só por pudor entrava de novo na gaiola. Era preciso esconder esse Baú no lado esquerdo da janela; era preciso esconder o seu segredo, ninguém poderia saber que ele era a ponte para o seu Éden! O enigma do Baú estava gravado em sua pele espessa e dura; seu lombo foi marcado muitas vezes com o barro rubro nos seus dedos do menino. Quando suas pernas, sozinhas, já bastavam como pontes, e o menino podia num golpe de vista alcançar os limites do seu reino, o Baú repousou para sempre em seu sono. Nunca mais foi despertado, ficando inerte no lado esquerdo da janela. E os enigmas inscritos em sua pele fugiram todos para o seu íntimo: nele Anselmo começou a guardar seus primeiros desenhos, seus rabiscos, suas anotações. Guardou também nele o livro do Peixe Blindado.


Al Duarte, do livro inacabado Um Peixe Blindado

quinta-feira, 14 de julho de 2011

O CAVALO

ACRÍLICO S/PAPEL
Alex Rocha


Quando falamos sobre o processo de dominação da natureza, muitos livros se limitam a explorar eventos pontuais tais como o uso do fogo, a descoberta da agricultura ou a invenção da roda. Em todos esses casos, observamos que o homem é colocado como um autor individual que, por meio do uso de suas faculdades mentais, estabeleceu mais uma conquista na luta pela sobrevivência. Contudo, ninguém costuma falar sobre os ganhos que as comunidades humanas ganharam, assim que fizeram uso dos cavalos.
Na Grécia Antiga, temos o aparecimento do antigo mito do centauro, uma fantástica criatura, meio homem e meio cavalo. Sob o ponto de vista filosófico, essa alegoria atestava a junção da inteligência que o homem possuiu ao vigor físico que os equinos dominam tão bem. De acordo com alguns estudiosos, esse personagem da mitologia grega teria origem nas antigas tribos nômades da Ásia, que organizavam seus ataques com o uso destes animais.
Prosseguindo pela Idade Média, vemos que os europeus incorporaram o animal ao seu mundo e chegaram ao ponto de inventarem academias responsáveis pelo adestramento dos animais e o ensinamento da montaria. E não pensem que foram apenas os cavalos que se subordinaram aos seus donos. As calças, tão comuns no vestuário da moda contemporânea, foram inicialmente inventadas para dar mais conforto na hora da montaria.
E assim, alguns milhares de anos, homem e cavalo se encontraram para a realização de várias tarefas que envolvem a agricultura, o transporte, a guerra e o esporte.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

A MULHER


Óleo S/Tela
60 X 80
A Mulher
 Alex Rocha




Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir

Ah, se ao te conhecer
Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir

Se nós nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir

Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu

Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu

Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios ainda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair

Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir.

                      Letra da música Eu te Amo de Chico Buarque

O DESTINO



80 X 100
Acrílico sobre tela
A PALAVRAS
Alex Rocha








Algumas pessoas nascem para sentar a margem de um rio
Outras são atingidas por um raio

.lgumas têm ouvido para música
Outras são artistas
Algumas nadam
Outras fabricam botões

Algumas conhecem Shakespeare
Outras são mães
E algumas pessoas dançam


Frases retiras do Filme O curioso Caso de Beijamim Button


terça-feira, 5 de julho de 2011

ARTE


O homem criou objetos para satisfazer as suas necessidades práticas, como as ferramentas para cavar a terra e os utensílios de cozinha. Outros objetos são criados por serem interessantes ou possuírem um caráter instrutivo. A arte é uma criação humana com valores estéticos (beleza, equilíbrio, harmonia, revolta) que sintetizam as suas emoções, sua história, seus sentimentos e a sua cultura.
O homem cria a arte como meio de vida, para que o mundo saiba o que pensa, para divulgar as suas crenças (ou as de outros), para estimular e distrair a si mesmo e aos outros, para explorar novas formas de olhar e interpretar objetos e cenas.
O que vemos quando admiramos um quadro depende de alguns fatores, nossa experiência e conhecimentos, nossa disposição no momento, imaginação e daquilo que o artista pretendeu mostrar



“Procure compreender o que dizem os artistas nas suas obras-primas, os mestres sérios. Aí está Deus”
Vincent Van Gogh

Mundo da Criança

Há onze anos, talvez inspirado no nascimento da minha filha, fiz uma série de trabalhos com temas infantis. Pintei brinquedos e brincadeiras, usando quase sempre lembranças da minha infância. A maioria desses trabalhos foram feitos usando a técnica de acrílico sobre tela com traços e pinceladas soltas bem espontâneas usando as tintas de forma instintiva tentando captar os sentimentos impressos na memória.


É sempre colorido, muitas vezes de papel
Com arcos, flechas, índios e soldados
Cheinho de presentes feitos por papai noel
O mundo da criança e iluminado

Baleias gigantescas, violentos tubarões
Mistérios de um espaço submerso
Espaçonaves passam por dez mil constelações
O mundo da criança é um universo
O mundo da criança é um universo





Pipas, peões, bolas, balões, skates e patins
Vovó, vovô, mamãe, papai, família
É fácil imaginar uma aventura
Dentro de uma selva escura
Com perigos e armadilhas
Viagens para encontrar minas de ouro
Piratas e um tesouro enterrado numa ilha



Imagens, games, bate-papos no computador
O tempo é cada vez mais apressado
E mesmo com todo esse imenso interativo amor
O mundo da criança é abençoado
O mundo da criança é abençoado



Toquinho