terça-feira, 28 de junho de 2011

CANTO PARA A MINHA MORTE


Eu sei que determinada rua que eu já passei
Não tornará a ouvir o som dos meus passos.
Tem uma revista que eu guardo há muitos anos
E que nunca mais eu vou abrir.
Cada vez que eu me despeço de uma pessoa
Pode ser que essa pessoa esteja me vendo pela última vez
A morte, surda, caminha ao meu lado
E eu não sei em que esquina ela vai me beijar
Com que rosto ela virá?
Será que ela vai deixar eu acabar o que eu tenho que fazer?
Ou será que ela vai me pegar no meio do copo de uísque?
Na música que eu deixei para compor amanhã?
Será que ela vai esperar eu apagar o cigarro no cinzeiro?
Virá antes de eu encontrar a mulher, a mulher que me foi destinada,
E que está em algum lugar me esperando
Embora eu ainda não a conheça?
Vou te encontrar vestida de cetim,
Pois em qualquer lugar esperas só por mim
E no teu beijo provar o gosto estranho
Que eu quero e não desejo,mas tenho que encontrar
Vem, mas demore a chegar.
Eu te detesto e amo morte, morte, morte
Que talvez seja o segredo desta vida
Morte, morte, morte que talvez seja o segredo desta vida
Qual será a forma da minha morte?
Uma das tantas coisas que eu não escolhi na vida.
Existem tantas... Um acidente de carro.
O coração que se recusa abater no próximo minuto,
A anestesia mal aplicada,
A vida mal vivida, a ferida mal curada, a dor já envelhecida
O câncer já espalhado e ainda escondido, ou até, quem sabe,
Um escorregão idiota, num dia de sol, a cabeça no meio-fio...
Oh morte, tu que és tão forte,
Que matas o gato, o rato e o homem.
Vista-se com a tua mais bela roupa quando vieres me buscar
Que meu corpo seja cremado e que minhas cinzas alimentem a erva
E que a erva alimente outro homem como eu
Porque eu continuarei neste homem,
Nos meus filhos, na palavra rude
Que eu disse para alguém que não gostava
E até no uísque que eu não terminei de beber aquela noite...
Vou te encontrar vestida de cetim,
Pois em qualquer lugar esperas só por mim
E no teu beijo provar o gosto estranho que eu quero e não desejo,mas tenho que encontrar
Vem, mas demore a chegar.
Eu te detesto e amo morte, morte, morte
Que talvez seja o segredo desta vida
Morte, morte, morte que talvez seja o segredo desta vida


Raul Seixas

sexta-feira, 24 de junho de 2011

O XITAMAR

       Final dos anos 8o, uma galera se encontra e começa a curtir juntos o velho Rock and roll. Foi assim durante boa parte dos anos 90. Perambulávamos por toda a cidade com “os enormes discos de vinil e suas capas escandalosas” debaixo do braço. Aquilo, juntamente com uma velha camiseta preta de alguma banda se compunha como uma espécie de uniforme, uma armadura que servia de identidade. Vários jovens andavam juntos, mas esses grupos quase sempre tinham o mesmo destino, a concha acústica. Lá debatíamos qual era o melhor guitarrista, a melhor banda, a banda mais “pesada”... Cada um defendia a sua predileta, é claro. Na TV, guerra do golfo, inflação e depois de muitas mudanças de moeda, a criação do Real, mas para nós, o assunto mais importe era música, ou, mais especificamente, rock and roll. Enquanto a humanidade ainda se fazia a pergunta clássica, tentando resolver a eterna dúvida, de onde vir, para onde vou? Nós, roqueiros naquela época, nos preocupávamos muito mais em saber qual era a melhor banda do mundo. Vivíamos uma revolução, não como as anteriores que já tínhamos ouvido falar ou mesmo estudado, por isso talvez não notávamos " revolução tecnológica" e mais ainda, estávamos no começo de um novo começo, de um novo mundo, palavras estranhas começavam a fazer parte do nosso vocabulário, globalização, CD, celular... E as pessoas começavam a se tornar ainda mais egoístas e individualistas e a mudar o seu comportamento cotidiano.
       Aos sábados, a galera sempre aparecia em casa, ai o assunto variava um pouco, garotas (as nega), resenha, muita resenha,.Numa dessas aparições regada com muita resenha, surgiu esse personagem ai, o Xitamar. Na ocasião um amigo nosso de iniciais G.O.S estava deixando o cabelo crescer e o resultado dessa transformação foi essa estranha figura (ele me mata se abrir essa página, rsrsrs) guardo ainda alguns desenhos dessa época.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

POEMA DE SETE FACES

ACRÍLICO S/PAPEL
O ANJO
Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.


Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 20 de junho de 2011

ENSAIO PARA ALEGRIA

Óleo s/tela
50 x 70
Por que as pessoas são infelizes? Por que há pessoas que batalham tanto e, por alguma razão, não conseguem alcançar a tão sonhada Felicidade? O que é felicidade, qual a sua relação com o dinheiro? Será que a felicidade mudou com o tempo ou será algo fantasioso, uma utopia, ou, será ainda ela realidade nua e crua estampada em nossas caras, mas difícil de ser notada?Onde está a felicidade?
Pingos d´água caíam do céu sobre a cidade de Itapetinga, manhã cinzenta de inverno ameno na Bahia. Por isso, entrei rapidamente no transporte coletivo que abria suas portas como abraço para mim. Ali me sentei, “retado” por não ter comigo uma máquina fotográfica ou mesmo um daqueles pequenos blocos de papel e um lápis para registrar a alegria e a felicidade que enchiam os corações presentes.
Pois apesar da neblina que deixava o clima triste naquela manhã, não havia como negar que uma velhinha desdentada sorria à minha frente, um rapazinho apaixonado sorria para a bela e sardenta namorada, logo ao meu lado, e mais adiante um trabalhador braçal também sorria feliz, com a marmita debaixo do braço. Só eu não achava graça nenhuma, pois me questionava procurando entender o que é felicidade.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

A TRISTE PARTIDA

Meu Deus, meu Deus
Setembro passou
Outubro e Novembro
Já tamo em Dezembro
Meu Deus, que é de nós,
Meu Deus, meu Deus
Assim fala o pobre
Do seco Nordeste
Com medo da peste
Da fome feroz
Ai, ai, ai, ai
A treze do mês
Ele fez experiênça
Perdeu sua crença
Nas pedras de sal,
Meu Deus, meu Deus
Mas noutra esperança
Com gosto se agarra
Pensando na barra
Do alegre Natal
Ai, ai, ai, ai
Rompeu-se o Natal
Porém barra não veio
O sol bem vermeio
Nasceu muito além
Meu Deus, meu Deus
Na copa da mata
Buzina a cigarra
Ninguém vê a barra
Pois barra não tem
Ai, ai, ai, ai
Sem chuva na terra
Descamba Janeiro,
Depois fevereiro
E o mesmo verão
Meu Deus, meu Deus
Entonce o nortista
Pensando consigo
Diz: "isso é castigo
não chove mais não"
Ai, ai, ai, ai
Apela pra Março
Que é o mês preferido
Do santo querido
Sinhô São José
Meu Deus, meu Deus
Mas nada de chuva
Tá tudo sem jeito
Lhe foge do peito
O resto da fé
Ai, ai, ai, ai
Agora pensando
Ele segue outra tria
Chamando a famia
Começa a dizer
Meu Deus, meu Deus
Eu vendo meu burro
Meu jegue e o cavalo
Nóis vamo a São Paulo
Viver ou morrer
Ai, ai, ai, ai
Nóis vamo a São Paulo
Que a coisa tá feia
Por terras alheia
Nós vamos vagar
Meu Deus, meu Deus
Se o nosso destino
Não for tão mesquinho
Ai pro mesmo cantinho
Nós torna a voltar
Ai, ai, ai, ai
E vende seu burro
Jumento e o cavalo
Inté mesmo o galo
Venderam também
Meu Deus, meu Deus
Pois logo aparece
Feliz fazendeiro
Por pouco dinheiro
Lhe compra o que tem
Ai, ai, ai, ai
Em um caminhão
Ele joga a famia
Chegou o triste dia
Já vai viajar
Meu Deus, meu Deus
A seca terrívi
Que tudo devora
Ai,lhe bota pra fora
Da terra natal
Ai, ai, ai, ai
O carro já corre
No topo da serra
Oiando pra terra
Seu berço, seu lar
Meu Deus, meu Deus
Aquele nortista
Partido de pena
De longe acena
Adeus meu lugar
Ai, ai, ai, ai
No dia seguinte
Já tudo enfadado
E o carro embalado
Veloz a correr
Meu Deus, meu Deus
Tão triste, coitado
Falando saudoso
Com seu filho choroso
Iscrama a dizer
Ai, ai, ai, ai
De pena e saudade
Papai sei que morro
Meu pobre cachorro
Quem dá de comer?
Meu Deus, meu Deus
Já outro pergunta
Mãezinha, e meu gato?
Com fome, sem trato
Mimi vai morrer
Ai, ai, ai, ai
E a linda pequena
Tremendo de medo
"Mamãe, meus brinquedo
Meu pé de fulô?"
Meu Deus, meu Deus
Meu pé de roseira
Coitado, ele seca
E minha boneca
Também lá ficou
Ai, ai, ai, ai
E assim vão deixando
Com choro e gemido
Do berço querido
Céu lindo e azul
Meu Deus, meu Deus
O pai, pesaroso
Nos fio pensando
E o carro rodando
Na estrada do Sul
Ai, ai, ai, ai
Chegaram em São Paulo
Sem cobre quebrado
E o pobre acanhado
Percura um patrão
Meu Deus, meu Deus
Só vê cara estranha
De estranha gente
Tudo é diferente
Do caro torrão
Ai, ai, ai, ai
Trabaia dois ano,
Três ano e mais ano
E sempre nos prano
De um dia vortar
Meu Deus, meu Deus
Mas nunca ele pode
Só vive devendo
E assim vai sofrendo
É sofrer sem parar
Ai, ai, ai, ai
Se arguma notíça
Das banda do norte
Tem ele por sorte
O gosto de ouvir
Meu Deus, meu Deus
Lhe bate no peito
Saudade de móio
E as água nos óio
Começa a cair
Ai, ai, ai, ai
Do mundo afastado
Ali vive preso
Sofrendo desprezo
Devendo ao patrão
Meu Deus, meu Deus
O tempo rolando
Vai dia e vem dia
E aquela famia
Não vorta mais não
Ai, ai, ai, ai
Distante da terra
Tão seca mas boa
Exposto à garoa
A lama e o paú
Meu Deus, meu Deus
Faz pena o nortista
Tão forte, tão bravo
Viver como escravo
No Norte e no Sul
Ai, ai, ai, ai

Patativa do Assaré

VERSOS ÍNTIMOS

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.


Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!



Augusto dos Anjos

sexta-feira, 10 de junho de 2011

O ARTISTA



A arte só acontece quando o artista se arrisca. Como alguém que pula de pára-quedas no escuro obedecendo e muitas vezes desobedecendo aos seus sentidos. Não pode ser fiel a um porque, mas, a todos sem obedecer a ninguém.
O artista é um ser criativo com o único compromisso, não ter compromisso. È compromisso do artista, quebrar regras, ou, ter uma só sua. Saber que não pode nem vai agradar a todos, porém, seu desejo é ser lembrado. Ser nada exatamente, tudo, um pouco, ser lembrado eternamente.




Alex Rocha
Acrílico s/tela
O Pintor

quarta-feira, 8 de junho de 2011

AS SANTINHAS

Acrílico S/tela
50 x70

O trabalho faz parte de uma série,nos quais, são exaltadas as formas femininas e as cores. Partindo da idéia de retalhos coloridos ou de vitrais o trabalho foi concebido.
A inspiração é a sexualidade da mulher, como essas formas exercem poder sobre nós mortais. Aqui essa sexualidade não vista como algo profano, mas, algo mágico, santo. As cores quentes das figuras sintetizam bem o termômetro dessa sensualidade.




As linhas da poesia de Júlia Licia (O GRITO DA ALMA) exalam esse cheiro, a sensualidade feminina, que segundo ela emana da alma.

http://amorpoesiajulialicia.blogspot.com/

sábado, 4 de junho de 2011

O TEMPO


Cromos é o deus do Tempo segundo a mitologia grega. O mesmo devorava os próprios filhos para que nenhum deles pudesse um dia roubar-lhe o trono. Zeus, porém, foi salvo por sua mãe, Réia, vindo posteriormente a destronar o pai e a tornar-se rei dos deuses.
O que chama atenção e o caráter destrutivo do tempo, tão valorizado pelo senso comum. Os objetos queridos, as paixões, as realizações mais grandiosas cedem perante esse “senhor” que parece reger os destinos.


O tempo cronológico, conforme é concebido no cotidiano, escorre na passagem da areia pelo orifício da ampulheta, nas badaladas de um velho relógio no alto de uma igreja, no tique-taque do despertador ou ainda, no silêncio de um moderno cronometro digital. È estranho, porém, em vários momentos temos a sensação de que o tempo vivido e o tempo cronológico não estão juntos, parece por muitas vezes não andar de mãos dadas. As horas e os dias muitas vezes indicam haver descompasso entre o que marcam os relógios e o os nossos sentimentos, o que indica ser o tempo pessoal regido por humores e sensações subjetivas. A alegria e o prazer são exemplos disso, geralmente acompanhados pela sensação de passagem rápida, enquanto a tristeza, o medo, a espera, parecem fazer de cada minuto um século. Esse descompasso, aliado ainda a falta de tempo do homem moderno que tento retratar nesse trabalho.

ÓLEO S/TELA
50 X 70

“Cada coisa tem um instante em que ela é. Quero apossar-me do é da coisa. Esses instantes que decorrem no ar que respiro: em fogos de artifício eles espocam mudos no espaço. Quero possuir os átomos do tempo. E quero capturar o presente...”
Clarice Lispector

sexta-feira, 3 de junho de 2011

quinta-feira, 2 de junho de 2011

BONECOS DE MADEIRA

Dois trabalhos usando a técnica, acrílico s/tela que fazem parte da série “bonecos de madeira”. O primeiro, boneco com muleta, o segundo, boneco desmontado. Sempre achei interessante e mágico esse mundo, no teatro de bonecos esses seres inanimados ganham vida e personalidade.
A história do Teatro de Bonecos é tão ancestral quanto à do próprio teatro tradicional. Esta arte já estava presente entre os primitivos que, deslumbrados com suas silhuetas nas paredes das cavernas, elaboraram o teatro de sombras, visando talvez entreter suas crianças. Desde então o Homem não estancou mais seu impulso criativo.

O Teatro de Bonecos nasceu há muito tempo, no Oriente. Lá ele conquistou um status espiritual e era tratado com muita reverência. Os orientais consideravam estes bonecos como verdadeiros deuses, dotados de recursos mediúnicos e fantásticos. Eles eram criados com tamanha perfeição que se tornavam idênticos aos seres vivos, muitas vezes inspirados realmente em personagens reais.
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A graça do boneco está em sua associação de movimento e sonoridade, o que encanta e seduz principalmente o público infantil. Está sempre intimamente ligado ao entorno histórico, cultural, social, político, econômico, religioso e educativo e ganha existência nos palcos por meio do movimento das mãos do ator que o manipula, narra as histórias e transcende a realidade, metamorfoseando o real em momentos de magia e sedução. Mas ele também tem um alto potencial educativo, podendo se converter em poderoso instrumento nas mãos de um bom educador